Bolsonaro, agora derrotado, irá para a cadeia?
O presidente brasileiro Jair Bolsonaro uma vez tentou prever o resultado de sua candidatura à reeleição em 2022: "Prisão, morte ou vitória".
Vitória não foi. A morte veio na forma do fim de sua presidência, que ele aceitou de má vontade na terça-feira - dois dias depois que a eleição foi declarada para seu oponente.
E prisão?
"Podem ter certeza de que essa opção... não existe", disse o líder de extrema-direita a membros de sua crucial base de apoio evangélico em agosto de 2021.
Analistas, no entanto, acreditam que um futuro atrás das grades pode ser uma perspectiva muito real para o belicoso Bolsonaro, mesmo que leve anos.
Quase desde o início de seu controverso mandato em 2019, Bolsonaro acumulou acusações e investigações por tudo, desde espalhar desinformação a crimes contra a humanidade.
Ele sobreviveu a mais de 150 pedidos de impeachment - um recorde.
A maioria deles foi sobre sua gestão falha da pandemia de coronavírus, que custou a vida de mais de 685.000 pessoas no Brasil – o segundo maior número de mortos do mundo depois dos Estados Unidos.
Enquanto estava no cargo, Bolsonaro foi protegido de consequências legais por dois aliados políticos: o procurador-geral Augusto Aras e Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados do Brasil.
Mas isso mudará em 1º de janeiro de 2023, quando seu arquirrival, o ex-presidente de esquerda Luiz Inácio Lula da Silva, assumir as rédeas mais uma vez, e Bolsonaro perder sua imunidade presidencial.
Problemas legais podem vir de várias frentes.
Um comitê do Senado brasileiro recomendou acusações sobre a gestão de Bolsonaro da pandemia de Covid-19, incluindo "crimes contra a humanidade".
O Bolsonaro, que nega a Covid-19, que defendeu curas não comprovadas e disse que as vacinas podem transformar as pessoas em "jacarés", também está sendo investigado por supostamente não agir em uma denúncia de peculato sobre a compra de vacinas contra o coronavírus.
Outra investigação está pendente sobre alegações de que Bolsonaro vazou uma investigação policial confidencial sobre acusações de corrupção contra seus filhos e interferiu em outra.
O presidente cessante foi ainda implicado em uma investigação sobre seu filho senador Flávio por um suposto esquema de cobrança de parte dos salários de funcionários políticos em uma prática conhecida como "rachadinha".
Esse caso foi arquivado sob a alegação de que Bolsonaro júnior gozava de imunidade parlamentar.
Bolsonaro sempre negou qualquer irregularidade, alegando ser vítima de perseguição política.
"Eles estão procurando uma maneira de chegar até mim", disse ele depois que o site de notícias online Uol publicou alegações, 30 dias antes da eleição, de que seus familiares haviam comprado 51 propriedades.
As propriedades foram pagas parcial ou totalmente em dinheiro por um total de cerca de US$ 4,7 milhões entre 1990 e 2022, com questões levantadas sobre a proveniência do dinheiro.
Houve também alegações de abuso de dinheiro público em seu turno para bajular os líderes evangélicos.
"Quando terminar seu mandato presidencial, Jair Bolsonaro responderá à Justiça e o Ministério Público poderá abrir novas investigações", disse à AFP o jurista Rogério Dultra dos Santos, da Universidade Federal Fluminense.
Bolsonaro foi eleito em uma plataforma anticorrupção em um momento em que o país estava se recuperando de um enorme escândalo de corrupção envolvendo a petroleira estatal Petrobras, o governo Lula e seu Partido dos Trabalhadores (PT).
As próprias convicções de Lula em relação a esse escândalo foram posteriormente anuladas.
Lula prometeu conceder acesso a documentos possivelmente comprometedores, oficiais e pessoais, que Bolsonaro selou por 100 anos antes de deixar o cargo.
Isso "pode ter consequências legais", disse Dos Santos.
No entanto, qualquer tentativa de levar Bolsonaro à justiça pode "levar vários anos", considerando a probabilidade de vários recursos ao longo do caminho, acrescentou o analista.
Ironicamente, Bolsonaro poderia se beneficiar de uma decisão da Suprema Corte que permitiu a libertação de Lula da prisão em novembro de 2019 enquanto se aguarda um recurso contra sua condenação por corrupção.
Mudando temporariamente de marcha de sua insistência anterior de que Lula nunca venceria a eleição, Bolsonaro disse recentemente que "ficaria fora da política" se perdesse.
Mas Mayra Goulart, cientista política da Universidade Federal do Rio de Janeiro, disse que ficaria "muito surpresa" se isso fosse verdade.
Legisladores e vários outros servidores públicos no Brasil gozam de imunidade de acusação enquanto estiverem no cargo.
Seja qual for seu destino legal, Goulart disse que Bolsonaro provavelmente seguirá um caminho semelhante ao de seu ídolo político, Donald Trump, "que mantém uma influência considerável na política americana apesar de sua derrota em 2020".
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