Escolhas difíceis à medida que Lula da Silva começa a trabalhar
Recém-saído de um feriado comemorativo na praia, o presidente eleito do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, tratou de assuntos mais feios na segunda-feira: descobrir como governar com um Congresso hostil, crise orçamentária desagradável e uma lista de tarefas aparentemente impossível.
A negociação política do período de transição agora começa a sério para o veterano esquerdista, que tomará posse para um terceiro mandato em 1º de janeiro, enfrentando uma perspectiva muito mais difícil do que o boom alimentado por commodities que ele presidiu nos anos 2000.
Lula, de 77 anos, comemorou sua vitória apertada sobre o titular de extrema-direita Jair Bolsonaro no segundo turno da eleição de 30 de outubro, fugindo na semana passada para a costa ensolarada da Bahia (nordeste).
Ele brincou que precisava de uma lua de mel tardia com sua futura primeira-dama, Rosângela "Janja" da Silva, com quem o ex-metalúrgico duas vezes viúvo se casou em maio.
Sua outra lua de mel - a política - pode ser curta, dizem os analistas.
Lula se reuniu na segunda-feira com assessores em São Paulo. No final da semana, ele viajará para a capital, Brasília, para iniciar as negociações com parlamentares, disseram aliados à AFP.
Ele enfrenta uma batalha para que os projetos de lei sejam aprovados em uma legislatura onde os conservadores obtiveram grandes ganhos nas eleições de outubro.
A coalizão de Lula tem cerca de 123 votos na Câmara dos Deputados, com 513 assentos, e 27, no Senado, com 81 assentos, o que significa que ele terá que fazer alianças para fazer qualquer coisa - e até mesmo sobreviver, dada a ameaça de impeachment no Brasil. onde dois presidentes sofreram impeachment nos últimos 30 anos.
Lula deve se reunir em Brasília com o presidente da Câmara, Arthur Lira, um importante aliado de Bolsonaro da frouxa coalizão de partidos conhecida como "Centrao", um grupo conhecido por fazer alianças com quem está no poder - em troca de se alimentar de o barril de porco federal.
Analistas dizem que Lula estará sob pressão do Centrão para não se opor ao chamado "orçamento secreto": 19,4 bilhões de reais (US$ 3,8 bilhões) em fundos federais basicamente não monitorados que Bolsonaro concordou em alocar para selecionar parlamentares para aumentar o apoio à sua candidatura à reeleição.
Enquanto isso, o dinheiro será curto para as promessas de campanha de Lula, incluindo aumento do salário mínimo e manutenção de um programa de assistência social de 600 reais por mês, "Auxilio Brasil".
Bolsonaro, que introduziu o programa, não alocou recursos suficientes para continuá-lo no orçamento de 2023.
Enfrentando a matemática impossível de financiar tais promessas sem quebrar o teto de gastos do governo, os aliados de Lula estão explorando suas opções, incluindo a aprovação de uma emenda constitucional que permite gastos excepcionais no próximo ano.
Mas eles estão correndo contra o relógio: deve ser aprovado até 15 de dezembro.
Lula, que concorreu com vagas promessas de restaurar a maior economia da América Latina aos tempos dourados de sua primeira presidência (2003-2010), herda uma economia em dificuldades desta vez.
"O desafio é... como equilibrar a responsabilidade fiscal com uma agenda social altamente antecipada", disse o cientista político Leandro Consentino, do Insper.
Os mercados estão acompanhando de perto - especialmente sua escolha para ministro das Finanças.
Lula deve dividir o "superministério" da economia de Bolsonaro em três pastas: finanças, planejamento e comércio e indústria.
"Podemos esperar uma política econômica não totalmente ortodoxa, mas que mantenha um certo nível de disciplina fiscal", disse Adriano Laureno, da consultoria Prospectiva.
Os nomes divulgados para o cargo financeiro incluem o ex-ministro da Educação de Lula, Fernando Haddad, e seu coordenador de campanha, Aloizio Mercadante.
Embora Bolsonaro fosse o favorito do mundo dos negócios, os mercados reagiram favoravelmente à vitória de Lula.
O real brasileiro subiu 2,2 por cento em relação ao dólar e a bolsa de valores de São Paulo subiu após o segundo turno - embora tenha caído 2,4 por cento nas negociações da tarde de segunda-feira, abaixo do nível pré-eleitoral, com a incerteza sobre a nova equipe econômica.
Outras pastas observadas de perto são o meio ambiente e um novo ministério de Assuntos Indígenas prometido – ambos pontos doloridos sob Bolsonaro, que presidiu uma onda de destruição na floresta amazônica.
O trabalho anterior poderia ir para a ex-ministra do Meio Ambiente de Lula, Marina Silva, creditada por conter o desmatamento nos anos 2000.
Em um gesto chave, o presidente eleito fará seu retorno ao cenário internacional na cúpula do clima COP27 da ONU no Egito, onde chegará na próxima semana, disseram assessores.
Silva, que viajará com ele, disse ao jornal Folha de São Paulo: "A questão climática é agora uma prioridade estratégica no mais alto nível".
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