O Brasil Enfrenta Dilema: Araras Ameaçadas Vs. Parque eólico
Um parque eólico no nordeste do Brasil soa como uma solução energética amigável ao clima, mas está causando controvérsia sobre outro tipo de preocupação ambiental: o impacto sobre a ameaçada arara-de-lear.
Lar de mais de 90 por cento da crescente indústria de energia eólica do Brasil, o nordeste é conhecido por ventos fortes e constantes que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer aproveitar para impulsionar uma revolução de energia verde.
A região atraiu o interesse da empresa francesa de energia renovável Voltalia, que inaugurou no ano passado um parque eólico de 28 turbinas e 100 megawatts no semiárido de Canudos, na Bahia.
Mas o projeto logo foi atacado quando se descobriu que as enormes turbinas, com suas pás de 120 metros (quase 400 pés) de diâmetro - uma ameaça conhecida para os pássaros em vôo - estavam sendo construídas em uma região de nidificação para a arara-de-lear. , um papagaio azul brilhante também conhecido como arara-índigo, ou pelo seu nome científico Anodorhynchus leari.
Nomeadas em homenagem ao poeta inglês do século 19, Edward Lear, as aves diminuíram para uma população estimada de não mais de 2.000 na natureza, pois a agricultura e a extração de madeira reduziram enormemente seu habitat.
O parque eólico é "muito arriscado", disse Marlene Reis, do Lear's Macaw Gardens Project, uma organização que tenta salvar a espécie.
"Isso pode aumentar consideravelmente o risco de extinção", disse ela à AFP.
E os danos "podem ser irreversíveis, principalmente para essas araras icônicas, que só vivem e se reproduzem nessa região".
Um tribunal federal suspendeu a fase final de construção das turbinas em abril, revogando as licenças da Voltalia.
"Não pode ser considerado um projeto de baixo impacto ambiental", dada a proximidade a uma espécie de ave em vias de extinção, decidiu o tribunal, ordenando novos estudos de impacto e consultas às comunidades locais.
A Voltalia recorreu da decisão.
"Os potenciais impactos ambientais e sociais já foram tratados exaustivamente", disse à AFP o gerente da Voltalia no Brasil, Nicolas Thouverez.
Os estudos de impacto exigidos pelas autoridades estaduais mostraram que as turbinas "não colocam em risco a conservação" da arara-real, disse ele.
"Eles demonstraram a viabilidade ambiental do projeto."
A empresa propôs reduzir os riscos pintando as turbinas para torná-las mais visíveis aos pássaros, além de equipar as araras com rastreadores GPS e instalar tecnologia que interrompe imediatamente o giro das pás quando elas sobrevoam.
O Brasil é líder mundial em energia verde.
Possui a maior porcentagem de eletricidade limpa no grupo de nações do G20, com 89%.
Lula, que assumiu o cargo em janeiro, prometeu expandir ainda mais.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse recentemente que Lula quer transformar o empobrecido nordeste do Brasil no "maior celeiro de energia renovável do mundo".
Silveira anunciou planos para instalar até 30 gigawatts de capacidade de produção de energia limpa no Nordeste, principalmente eólica e solar.
O investimento total pode chegar a R$ 120 bilhões (US$ 24 bilhões).
Mas Voltalia oferece um estudo de caso do tipo de projetos de oposição que podem ocorrer no terreno.
Além dos protestos contra a arara-real, a empresa enfrenta resistência de pequenos fazendeiros comunitários e pecuaristas, dos quais cerca de 7.500 vivem na área ao redor do parque eólico.
"O impacto será sentido em todos os setores", disse Adelson Matos, 65, um fazendeiro de barba branca que cuida de cabras, ovelhas, vacas, galinhas e frutas no vilarejo vizinho de Alto Redondo.
O parque eólico é barulhento, atrai tráfego de veículos o tempo todo e alterou os padrões de chuva e vento com suas enormes estruturas, reclamou Matos.
"Ele quebra toda a harmonia com o habitat natural", disse à AFP.
"Tudo em nome do progresso", disse ele amargamente.
© Copyright AFP 2024. All rights reserved.